A pressão de Estados e municípios contra a lei que instituiu o piso salarial nacional de R$ 950 para o magistério público surtiu efeito. Apesar de a ter sancionado há três semanas, o presidente Lula decidiu solicitar à Advocacia-Geral da União um parecer sobre sua constitucionalidade. Na realidade, o órgão fora ouvido quando o projeto subiu para sanção presidencial, mas essa foi a brecha jurídica encontrada pelo Palácio do Planalto para ganhar tempo e tentar fechar um acordo com os governadores.
O piso salarial unificado para os professores da rede pública de ensino básico é uma antiga reivindicação da categoria. Em 1994, chegou-se a firmar um acordo com o governo do então presidente Itamar Franco - que, no entanto, não foi implementado.
A medida sempre contou com o endosso dos especialistas em pedagogia e a nova tentativa de convertê-la em lei surgiu em 2007, por iniciativa do senador Cristovam Buarque (PDT-DF), com apoio do ministro da Educação, Fernando Haddad. A lei aprovada pelo Senado, na última sessão antes do recesso de julho, determinou que os R$ 950 comecem a ser pagos gradativamente a partir de 2009 e concedeu aos Estados e municípios o prazo de três anos para a aplicação integral do piso, que será corrigido anualmente com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).
O problema é que, durante sua tramitação no Congresso, o projeto sofreu várias alterações, por pressões corporativas de entidades de trabalhadores do setor educacional. Uma das emendas impôs o pagamento dos R$ 950 a todos os professores aposentados - uma medida onerosa, que carece de qualquer justificativa pedagógica. Outra, estabeleceu que 33% da jornada de trabalho de 40 horas semanais dos professores sejam reservadas para atividades extraclasse, como planejamento e preparação de aulas. Hoje, esse porcentual oscila entre 20% e 25%. Além disso, o projeto excluiu do cálculo do piso salarial unificado as gratificações funcionais do professorado, como qüinqüênios e sexta parte.
Foram essas alterações que levaram prefeitos e governadores a declarar guerra contra a lei. Eles alegam que a imposição de 33% da jornada de trabalho para atividades extraclasse os obrigará a contratar grande número de professores. No Rio Grande do Sul, seriam necessários 27,4 mil docentes, além dos 83 mil em atividade. São Paulo, que já tem 243 mil professores, teria de contratar outros 80 mil. E Minas, com 160 mil professores, teria de contratar mais 16 mil. A estimativa do Conselho Nacional de Secretários da Educação, com base em dados de 14 Estados, é de que a cada quatro docentes será preciso contratar um novo, inflando a folha de pagamento.
Para a entidade, essa medida, conjugada com a extensão do piso nacional a aposentados e pensionistas, levará os Estados a ultrapassarem o teto de gastos com pessoal fixado pela Lei de Responsabilidade Fiscal, que limita em 49% da receita corrente líquida estadual a despesa total com funcionários do Poder Executivo. Com a nova lei, os gastos de alguns Estados com a folha de pagamento do magistério, como Minas Gerais e Rio Grande do Sul, podem crescer até 50%. Em 2007, pelo menos oito Estados - Acre, Alagoas, Goiás, Minas, Pará, Paraíba, Piauí e Rio Grande do Norte - encerraram o exercício fiscal com despesas de pessoal próximas do limite.
Os governadores também criticam a obrigatoriedade de reajuste anual do piso, alegando que a imposição da medida por lei federal é uma ingerência indevida da União nas relações contratuais de cada Estado com o magistério. E reclamam da utilização do INPC como indexador, pois esse indicador poderá produzir desequilíbrios orçamentários, se a inflação crescer mais do que a receita.
Para tentar derrubar a lei, alguns governadores ameaçaram recorrer ao STF, enquanto outros levaram suas queixas diretamente ao Palácio do Planalto. Diante de tanta pressão, Lula mostrou que aceitará uma negociação. A idéia é conceder o piso só aos docentes ativos e revogar as medidas que inflam a folha de pagamento sem melhorar a qualidade de ensino.
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