ELIANE CANTANHÊDE
BRASÍLIA - Num mesmo dia, 10 de outubro de 2012, o Supremo Tribunal Federal condena o antes todo-poderoso chefe da Casa Civil de um dos governos mais populares do país e elege um ministro negro para presidi-lo pela primeira vez na história. Esse é o novo Brasil.
José Dirceu de Oliveira e Silva tem uma biografia exuberante.
O moço bonito de sotaque caipira que sai da cidadezinha mineira de Passa Quatro para liderar os estudantes do Brasil inteiro contra uma ditadura (e, de quebra, partir corações femininos de norte a sul).
O jovem líder que é preso, trocado por um embaixador sequestrado, treinado em Cuba e que muda o rosto e a identidade para voltar ao país e reconstruir a vida.
O clandestino que divide a cama, a mesa, as finanças e um filho com uma mulher por anos, sem lhe dizer quem é, de onde vem, para onde vai.
O político que ressurge das cinzas para retomar, vibrante, a vida política e criar o Partido dos Trabalhadores, embalar o mito Lula e garantir-lhe condições práticas de vitória -tapando o nariz, mergulhando no sistema, deixando-se levar alegremente pela correnteza política.
O braço direito do primeiro presidente "de esquerda", que instalou dentro do Planalto sua capacidade de mando, sua influência sobre o PT e a imensa experiência em manipular aparelhos. Antes, os militantes. Depois, os partidários. Por fim, os de governo. Estado e partido, os fins justificam os meios?
Cai José Dirceu, sobe Joaquim Barbosa, o negro, o filho de pedreiro, o homem que inebria o país com seu carisma e seus votos implacáveis no que se convencionou chamar de "julgamento do século". E que presidirá a mais alta corte brasileira.
Quis o destino, ops!, quis o processo político, social e econômico que o grande condenado, quando a lei passa a valer para todos, seja justamente quem tanto se empenhou para construir esse novo Brasil. O réu Dirceu é vítima do próprio Dirceu.
Fonte: Folha de São Paulo
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